O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por meio do Promotor de Justiça de Anaurilândia, Allan Thiago Barbosa Arakaki, ajuizou ação civil pública de obrigação de não fazer com pedido de liminar em face do referido Município, na qual requereu a declaração incidental de inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 617/2015, bem como a condenação deste a se abster de doar imóveis genericamente no corrente ano eleitoral e com lastro na lei municipal mencionada.

O representante do Ministério Público Estadual aduziu na ação que, logo no início deste ano, chegou ao conhecimento da Promotoria de Justiça a implantação de um loteamento urbano, aprovado pela Câmara Municipal de Anaurilândia, sendo que os interessados deveriam se cadastrar na Secretaria Municipal de Assistência Social para serem contemplados.

Diante das informações, foi instaurado o Procedimento Preparatório nº 06/2016, na Promotoria de Justiça de Anaurilândia, visando apurar eventual ilegalidade na edição da Lei Municipal nº 617/2015, que foi aprovada por unanimidade pela Câmara Municipal e autorizou o Poder Executivo Municipal a doar lotes de sua propriedade, sem o parcelamento do solo.

A fim de instruir o procedimento extrajudicial instaurado, foram promovidas oitivas na Promotoria de Justiça, constatando-se que houve aumento substancioso de requerimentos de alistamento, transferência e revisão eleitoral a partir do mês de novembro/2015 na Comarca, o que seria atípico, tendo ainda alguns eleitores justificado que estavam regularizando seus títulos para se inscreverem no cadastro da Prefeitura e serem contemplados com terrenos.

O Promotor de Justiça Allan Thiago Barbosa Arakaki ajuizou a ação defendendo que a Lei Municipal nº 617/2015 é flagrantemente inconstitucional, visto que: a) ofende o art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/97, que proíbe expressamente doação de bens pelo ente público em ano eleitoral; b) ofende os princípios da moralidade, legalidade e impessoalidade, pois há elementos de que a doação de terrenos estaria condicionada à comprovação de capacidade eleitoral ativa, por meio da regularização do título de eleitor, constituindo uma manobra eleitoreira.

Na ação ajuizada também se questionaram vários dispositivos da lei municipal de constitucionalidade duvidosa: a) o art. 2º, “caput”, da LM nº 617/2015, o qual prevê que 10% das áreas doadas seriam destinadas a servidores efetivos, isto é, que não podem ser exonerados livremente pelo próprio Prefeito Municipal; b) art. 10, § 2º, da LM nº 617/2015, estipulando que os interessados deveriam se cadastrar perante a Secretaria Municipal de Assistência Social, ocupada atualmente pela esposa do Prefeito, sendo cabível da decisão recurso direcionado ao próprio Gestor Municipal, isto é, ao marido daquela.

Apontou o Promotor de Justiça o fato de a Lei Municipal nº 617/2015 ser genérica, representando verdadeira renúncia de competência constitucional do próprio Legislativo Municipal, ofendendo, por conseguinte, o art. 17 da Lei de Licitações e o princípio da legalidade. Postulou, por fim, a declaração de inconstitucionalidade da lei municipal e a condenação do Município a se abster de doar terrenos com lastro naquela.

Ajuizada a ação civil, o Juiz de Direito em substituição, Marcel Goulart Vieira, concedeu liminar, com fundamento nos argumentos expendidos pelo MPMS, determinando ao Município de Anaurilândia que se abstenha de realizar doação de imóveis com base na Lei Municipal nº 617/2015, fixando ainda, em caso de descumprimento, multa diária de R$ 1 mil.

Sem prejuízo, foi determinado que se oficiasse ao Procurador-Geral de Justiça a fim de que tenha ciência da lei municipal hostilizada, bem como para, caso entenda cabível, ajuíze ação direta de inconstitucionalidade perante o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul.