O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por meio dos Promotores de Justiça Ricardo Rotunno, Eteocles Brito Mendonça Dias Junior e Izonildo Gonçalves de Assunção Júnior, ingressou com Tutela Provisória Cautelar de Urgência em Caráter Antecedente contra o Município de Dourados (MS) e o Estado de MS devido ao colapso na assistência de alta complexidade em oncologia em Dourados.

De acordo com os autos, em fevereiro de 2015, foi instaurado o Inquérito Civil n. 03/2015, para averiguar a regularidade e tempestividade dos repasses financeiros promovidos pela Associação Beneficente Douradense – Hospital Evangélico de Dourados ao Centro de Tratamento de Câncer de Dourados (CTCD).

Todavia, o Poder Público, demonstrando absoluta falta de planejamento e cautela, ignorou a ausência de capacidade técnica e operacional da Associação Beneficente Douradense – Hospital Evangélico de Dourados para, à época, sozinho, cumprir todas as etapas de tratamento oncológico dos pacientes de Dourados e Macrorregião, pois nunca dispôs de toda a estrutura material e humana necessária para a assistência médica integral a pacientes oncológicos, especialmente sessões de quimioterapia e radioterapia. Em razão disso, até os últimos dias, terceirizava tais serviços médicos ao Centro de Tratamento de Câncer de Dourados - CTCD, com o qual possuía relação contratual desde 1999.

Ocorre que a Associação Beneficente Douradense – Hospital Evangélico de Dourados,  e não o Centro de Tratamento de Câncer de Dourados – CTCD, é e sempre foi a única entidade hospitalar habilitada no Sistema Único de Saúde como serviço de Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia, e recebia por isso, diretamente do Fundo Municipal de Saúde, os valores atinentes à prestação desses serviços.

Em 29/05/1999, foi firmado um incomum vínculo contratual entre o HE e CTCD, classificado pelas partes como um contrato de comodato, mas de conteúdo bem mais abrangente, pois praticamente terceirizava à margem de qualquer previsão legal,  regulamentar e contratual, a prestação de serviços de alta complexidade de Oncologia em favor de entidade não vinculada ao Sistema Único de Saúde, ou seja, o CTCD. E pior, como o aparente aval do Estado de Mato Grosso do Sul e do Município de Dourados, cujos representantes legais, à época, assinaram referido termo contratual na qualidade de “intervenientes garantidores”.

A pactuação obrigava o Hospital Evangélico de Dourados – único credenciado para a prestação de serviços de alta complexidade de Oncologia perante Sistema Único de Saúde – a repassar ao CTCD, mensalmente, 90% dos repasses mensais recebidos por produção do Fundo Municipal de Saúde para o tratamento em alta complexidade de Oncologia. Por terceirizar seu credenciamento em alta complexidade de Oncologia junto ao SUS e juntos aos planos de saúde, o Hospital Evangélico de Dourados cobrava do CTCD o percentual de 10% sobre toda a produção.

Todavia, o Hospital Evangélico de Dourados sempre atrasou, sistematicamente, os repasses mensais assumidos a título de obrigação contratual, sendo que, há cerca de um ano, houve um aumento preocupante na frequência e periodicidade dos atrasos dos repasses, que segundo o CTCD, chegou, em junho de 2016, a ultrapassar um milhão de reais. Com isso, o CTCD  ficou em situação de evidente fragilidade financeira, principalmente perante seus credores (notadamente, fornecedores de medicamentos e insumos). Pior, não conseguiu dar continuidade da prestação dos serviços oncológicos. Houve paralisação de ministração de medicamentos e de sessões de quimioterapia e radioterapia, trazendo evidentes malefícios a diversos pacientes.

Nesse sentido, o Componente Municipal de Auditoria do SUS constatou, em inspeção in loco, efetivada em maio de 2016, que 58% da amostra analisada estava com atraso superior a dez dias, ao passo que 11%, estava com atraso superior a 30 dias.

Os diversos desentendimentos entre as entidades hospitalares ocasionou o encerramento litigioso da parceria com a retomada dos serviços de oncologia unicamente pelo Hospital Evangélico. Contudo, iniciou-se pesada discussão judicial sobre a ocupação do imóvel onde hoje se localiza o CTCD e sobre a propriedade do aparelho que radioterapia mantido no interior desta entidade, o único dessa natureza existente em Dourados.

Em razão disso, as sessões de radioterapia em Dourados, sejam cumuladas com quimioterapia, sejam isoladas, encontram-se interrompidas, inclusive com bloqueios de novos agendamentos via SISREG, o que prejudicou diversos pacientes que precisam iniciar seus tratamentos com urgência.

Diante do exposto, os Promotores de Justiça pedem que seja concedida liminarmente Tutela Provisória de Urgência em Caráter Antecedente, para fins de os requeridos Estado de Mato Grosso do Sul e Município de Dourados promovam, no prazo improrrogável de 24 horas, a assunção direta e o restabelecimento imediato dos tratamentos oncológicos de alta complexidade, modalidades radioterapia e quimioterapia, em conjunto, ou radioterapia, isoladamente, de todos pacientes oncológicos de Dourados, com as indicações clínicas para continuidade ou início dessas modalidades de tratamento junto ao SUS; promovam, por conseguinte, imediata e solidariamente, o encaminhamento de todos os pacientes oncológicos atendidos pelo SUS, com indicação clínica para início ou continuidade de quimioterapia e radioterapia, em conjunto, ou radioterapia, isoladamente, para outras cidades com unidades hospitalares habilitadas para a mesma  referência de alta complexidade em oncologia, tais como Campo Grande (MS), Presidente Prudente (SP), Barretos (SP), Cascavel (PR) e Maringá (PR), etc; e alternativamente,  determinação judicial de expedição imediata de ato formal de requisição administrativa do aparelho de radioterapia Acelerador Linear Marca Varian 4/80, localizado nas dependências do CTCD, a ser utilizado por um período diário mínimo de cinco horas consecutivas, para fins de tratamento exclusivo de pacientes oncológicos com prescrição de radioterapia, via SUS.

Texto: Ana Paula Leite/jornalista ASSECOM MPMS

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