O juiz de Direito David de Oliveira Gomes Filho acatou parcialmente o pedido do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul e determinou a indisponibilidade de bens dos réus no valor de até R$ 13.292.569,30 envolvidos em suposto esquema de fraude em licitação e pagamento de propina em contratos de coleta de lixo em Campo Grande.

A Ação Civil Pública c.c. Pedido de Liminar proposta pelos promotores de justiça Adriano Lobo e Humberto Lapa Ferri contra o Munícipio de Campo Grande, CG Solurb Soluções Ambientais SPE Ltda, LD Construções LTDA, Financial Construtora Industrial LTDA, Antônio Fernando de Araújo Garcia, Luciano Potrich Dolzan, Lucas Potrich Dolzan, Nelson Trad Filho, Maria Antonieta Amorim Trad, e João Alberto Krampe Amorim dos Santos aponta que o edital licitatório n. 66/2012, como o decorrente contrato de concessão administrativa n. 332/2012, referente  aos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos da Capital foram superfaturados, com vícios formais insanáveis e que foi pago R$ 29.245.500,00 pela aquisição da fazenda Papagaio com dinheiro de propina, em boa parte, saído deste contrato de coleta de lixo, conforme investigação feita pela Polícia Federal. Os documentos comprovam o caminho do dinheiro, desde os cofres públicos municipais até a aquisição do bem em benefício do então prefeito e da sua esposa.

Em meados de setembro de 2017, o Ministério Público Estadual instaurou procedimento preparatório n. 06.2017.00000488-4, visando apurar suposta irregularidade no contrato de prestação de serviços de tratamento de chorume, firmado entre o Município de Campo Grande e a empresa Águas Guariroba. Durante o curso das investigações, identificou-se que a irregularidade decorria do edital de licitação n. 66/2012 e do contrato de concessão administrativa n. 332/2012, cujo objeto era a contratação, na modalidade de concessão administrativa, dos serviços públicos de limpeza urbana, coleta e destinação ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e a operação e manutenção dos Aterros Sanitários. Constou no edital, cláusula que isentava a concessionária dos custos que envolviam o tratamento dos efluentes líquidos provenientes dos aterros Dom Antônio Barbosa I e II e que essa despesa seria suportada pela administração municipal.

Entretanto é danoso ao erário, pois além de o Município já pagar e caro pelo contrato questionado ainda se vê obrigado a pagar pelo tratamento do efluente líquido do lixo, uma duplicidade de despesa indefensável. Vale ressaltar que o tratamento do chorume, somente no período de dezembro de 2012 a novembro de 2016, já havia custado aos cofres municipais cerca de R$ 13.292.569,30.

Ocorre que do ali apurado, constatou-se que o então prefeito municipal Nelson Trad Filho recebeu cifras milionárias em razão da fraude na concorrência n. 66/2012 que teriam sido repassadas a ele de forma oculta, mediante a aquisição de imóveis rurais em nome de Maria Antonieta Amorim Trad. Consta que, a partir de 2006 a 2012, foram adquiridas três fazendas (AREIAS, SÃO BENTO e PAPAGAIO), nos municípios de Bonito e Porto Murtinho (MS), parte delas, em favor de Maria Antonieta Amorim Trad, sendo possível constatar que pelo menos a fazenda Papagaio foi adquirida com recursos originários da CG SOLURB pagos pela prefeitura de Campo Grande.

Conforme os autos, Maria Antonieta adquiriu sua parte em tais fazendas por meio de suposto empréstimo concedido por sua sobrinha Ana Paula Amorim Dolzan, esposa de um dos proprietários da CG SOLURB, e, posteriormente, alega que "quitou" os empréstimos com rendimentos da própria fazenda, situação típica de lavagem de dinheiro. Na empresa PROTECO, os Policiais Federais encontraram uma pasta com o título “fazenda Papagaio”, contendo um instrumento particular de compromisso de compra e venda de um imóvel rural, diversos comprovantes de pagamentos, cópias de cheques e anotações diversas referentes a aquisição de um imóvel rural.

Diante dos fatos, o MPMS pediu liminarmente a determinação da Administração Municipal, no prazo de seis meses, realizar nova licitação para os serviços retratados na concorrência n. 66/2012; a suspensão do contrato decorrente da concorrência n. 66/2012; obrigar o Consórcio CGSOLURB a arcar com os custos do tratamento do Chorume; determinar ao Município de Campo Grande o bloqueio junto a eventuais créditos do Consórcio CGSOLURB de quantia correspondente aos valores pagos a título de tratamento do Chorume provenientes dos Aterros Sanitários; e a indisponibilidade dos bens dos requeridos (a exceção do ente público), no valor de R$ 100 milhões a fim de resguardar o ressarcimento pleiteado e o pagamento de danos morais coletivos.

Na decisão o juiz de Direito David de Oliveira Gomes Filho observou que a pretensão do Ministério Público Estadual não será acolhida na integralidade, ao menos, não neste momento do processo, em que a parte contrária sequer foi ouvida. Observo ainda que, salvo o Município, todos os demais requeridos são apontados pelo MPMS como membros de uma quadrilha que, de algum modo, participou ou se beneficiou da fraude na licitação e no contrato, razão pela qual, seriam responsáveis pelos prejuízos reclamados na ação. Por este motivo, é que o bloqueio de bens alcançará a todos os réus, salvo, por enquanto, a CG Solurb Soluções Ambientais – SPE Ltda., justamente para que o serviço de coleta de lixo não seja prejudicado e com isto, seja preservada a sociedade, que necessita deste serviço de forma ininterrupta.

Sendo assim, o juiz deferiu parcialmente os pedidos liminares para determinar a indisponibilidade de bens dos requeridos (salvo do Município e da CG Solurb Soluções Ambientais SPE Ltda) o limite de R$ 13.292.569,30; suspender o item 2.1.14.2.11.2 do Anexo II do Edital e a cláusula correspondente do contrato, que isentou o licitante vencedor (Consórcio CG Solurb) de arcar com os custos do tratamento do chorume produzido a partir do depósito do lixo; e autorizar o Município de Campo Grande a reter valor suficiente, a cada mês, para honrar com os pagamentos mensais de tratamento do chorume, do repasse que faz para o Consórcio CG Solurb.

Texto: Ana Paula Leite/jornalista Assecom MPMS

Foto: Capital News