Foi realizada, no dia 26 de novembro deste ano, na sede do Núcleo Regional de Saúde em Ponta Porã, a primeira reunião de trabalho do Projeto Mediação Sanitária, lançado pela 1ª Promotoria de Justiça daquela Comarca, com atribuições na esfera da saúde pública, a fim de solucionar dezenas de problemas sanitários sob investigação.

O projeto é inspirado no modelo existente no Ministério Público de Minas Gerais desde 2012 e visa criar uma instância de discussão interinstitucional como estratégia de superação do viés da política partidária, buscando-se a organização dos serviços regionalizados de saúde sem a necessidade de judicialização – que, segundo dados do Ministério da Saúde, cresce 15% ao ano, somando 50 milhões de processos em todo o Brasil.

A mediação sanitária objetiva enfrentar os problemas existentes na saúde pública mediante o comprometimento e responsabilização coletiva, sendo a prática inclusive recomendada pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), especialmente porque as políticas de saúde demandam planejamento e coordenação dos gestores.

Instituída em reunião durante o mês de outubro de 2015, a Comissão de Mediação Sanitária atualmente conta com a participação efetiva da Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul, Coordenadoria de Controle, Avaliação e Auditoria do Estado de Mato Grosso do Sul, Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus), Procuradoria do Estado de Mato Grosso do Sul, Secretarias de Saúde dos Municípios de Ponta Porã, Aral Moreira e Antônio João, bem como representantes do legislativo municipal desses municípios; Conselho Regional de Enfermagem, Conselho Regional de Medicina, Coordenação Estadual de Assistência Farmacêutica e Coordenação Estadual de Vigilância Sanitária, além de representantes dos Conselhos Municipais de Saúde.

Foi destacada, na ocasião da instalação da comissão pelo seu presidente, Chefe do Núcleo Regional de Saúde em Ponta Porã, a necessidade de se fortalecer a articulação regionalizada entre todos os municípios integrantes da microrregião de saúde, inclusive para fomentar o enfrentamento dos problemas sanitários de modo conjunto e simultâneo. Segundo dados do IBGE (2013), o Estado tem uma população estimada de 2.587.267 habitantes em 79 municípios, sendo que 63% dos municípios apresentam população menor que 20.000 habitantes. Campo Grande e Dourados concentram 40% da população do Estado e apenas cinco municípios possuem mais que 50.000 habitantes. Neste contexto, Ponta Porã, integrante da Macrorregião de Dourados (Região n. 03, a segunda maior do Estado), é também sede de Microrregião (Microrregião 3.4) integrada pelos municípios de Amambai, Antônio João, Aral Moreira, Coronel Sapucaia, Paranhos, Ponta Porã, Sete Quedas e Tacuru (3ª maior Microrregião, após Campo Grande e Dourados, com 182.994 habitantes). Assim, a resolutividade regionalizada dos problemas identificados pretende garantir o fortalecimento da regionalização, evitando-se soluções fragmentadas que, a médio prazo, tendem a se desatualizar e perder sua eficácia inicial.

Nesse sentido, à Comissão de Mediação também agregaram-se todas as autoridades sanitárias dos municípios da microrregião, representantes de gestores, dos conselhos de saúde e legislativo municipal, inclusive tendo sido convidados os Promotores de Justiça das comarcas de Amambai, Sete Quedas e Iguatemi, juntamente com representante do Ministério Público Federal na região, para integrar os trabalhos e fortalecer a participação do Ministério Público na fiscalização construtiva do Sistema Único de Saúde (SUS).

Na reunião de trabalho realizada em novembro, após breve contextualização dos princípios e diretrizes do SUS, discutiram-se, durante mais de quatro horas, por todos os municípios integrantes da microrregião, os seguintes assuntos: 1. Estrutura Organizacional das Secretarias Municipais de Saúde; 2. Gestão e Independência na Ordenação de Despesas da Saúde; 3. Controle Social; 4. Ouvidorias; 5. Controle de Vetores e 6. Assistência Farmacêutica. Ao final do primeiro encontro, que contou com a presença da presidente da Comissão Intergestores Regional de Dourados, pactuou-se entre os participantes uma série de obrigações a serem cumpridas até a próxima reunião de mediação sanitária, a ser realizada em março de 2016.

Com relação à estrutura organizacional da secretaria municipal de saúde e à independência da gestão e ordenação de despesa da saúde, ficou pactuado que cada município elaborará o regimento interno e organograma de sua secretaria municipal de saúde, publicado em diário oficial, mediante decreto. No mesmo prazo, será trazida também à Comissão de Mediação Sanitária a informação oficial do município acerca da existência de decreto municipal que tenha delegado competência de ordenador de despesa do Fundo Municipal de Saúde ao Secretário Municipal de Saúde. Caso referido decreto não exista, os municípios deverão trabalhar no sentido de elaborar e aprovar esta delegação no plano legislativo.

Referente ao controle social e ouvidorias, pactuou-se que cada município trará informações atualizadas acerca do nível e estágio de implantação da ouvidoria do SUS (Portaria GM n. 2416, de 7 de novembro de 2014), objetivando agilizar a execução deste serviço durante o próximo ano junto ao Ministério da Saúde e Secretaria de Estado de Saúde. Pactuou-se também que cada Conselho Municipal de Saúde trará sua programação anual, indicando as datas das reuniões e o planejamento das ações de fiscalização a serem executadas durante o ano. Deverá também cada Conselho trazer cópia de sua lei de criação e regimento interno, visando a discussão de sua adequação às normas que regulamentam sua criação, bem como que lhes asseguram autonomia administrativa e financeira sem interferência governamental. Todos também acordaram que, a partir da próxima reunião, será definido um possível cronograma de capacitação de todos os conselhos de saúde da microrregião.

Sobre a Assistência Farmacêutica, pactuou-se que os municípios, a partir de março de 2016, utilizarão mecanismo que garanta a informação ao cidadão que procura a rede e não obtém o medicamento prescrito, sendo sugerida na ocasião a experiência de Ponta Porã, que utiliza um carimbo no verso das receitas médicas. Para a mesma data, pactuou-se também pela implementação de rotina para que o médico servidor público, ao prescrever medicamentos ou tratamento não fornecidos pelo SUS, faça-o de maneira fundamentada, mediante relatório médico complementar anexo ao receituário. Pactuou-se também pela criação de comissão técnica multidisciplinar dentro das secretarias de saúde para revisar os receituários de medicamentos não fornecidos, acompanhados ou não do relatório médico complementar. Nesse sentido, deverá ser estabelecido um fluxo administrativo para o trâmite desta revisão, com prazos a serem cumpridos, possibilitando assim que eventual aquisição do fármaco ou mesmo sua substituição possa se dar administrativamente. Ficou ainda definido que, na próxima reunião, deverá ser discutida a realização de uma reunião entre Médicos e outros servidores da saúde, Juízes, Promotores de Justiça, Defensores Públicos, Advogados de cada município a fim de esclarecer quanto à Política Nacional de Assistência Farmacêutica.

Com relação ao último ponto discutido na reunião, Controle de Vetores, especificamente relacionado à execução efetiva das metas estabelecidas pelo Programa Nacional de Combate à Dengue (PNCD), pactuou-se que os municípios deverão, caso necessário, promover a revisão legislativa de seu código de postura, código sanitário ou lei específica existente relativa à obrigação dos proprietários manterem seus imóveis limpos e roçados de modo que, caso não haja cumprimento da norma num prazo curto estabelecido pela lei, seja-lhes imposta multa razoável a fim de desestimular a prática, sem prejuízo de haver previsão de que o serviço de limpeza seja executado imediatamente pelo município (em razão da questão sanitária ser prioridade) e o valor do serviço executado pelo mesmo seja repassado ao infrator mediante lançamento do valor no IPTU.

Também acordou-se que os municípios deverão elaborar decreto municipal a fim de dar amparo legal às ações de campo de combate ao vetor transmissor da dengue em imóveis fechados ou com acesso negado pelo morador em cujo interior os agentes de combate às endemias e agentes comunitários de saúde não possam ingressar. Nesse sentido, o decreto dará efetividade às ações de controle de vetores quando haja a caracterização no território de situação de iminente perigo à saúde conforme estabelecido pela Portaria GM n. 1.172, de 15 de junho de 2004, permitindo aos agentes de saúde o ingresso na residência.

Por fim, acordou-se que os municípios deverão trazer para a próxima reunião a relação das ações e planejamentos executados em relação ao combate do mosquito Aedes aegypti nos meses de novembro/2015 até março/2016, visando troca de experiências e aperfeiçoamento das ações, especialmente diante dos novos desdobramentos sanitários oriundos do zika vírus, que em realidade demonstra que as ações de controle de vetores não estão sendo eficazes e planejadas de modo coordenado.

Para o ano de 2016, além dos temas já iniciados, também haverá ampla discussão na microrregião de saúde sobre a Política Nacional de Hospitais de Pequeno Porte; Recursos Humanos nas Redes de Saúde; Atenção Básica; Saúde Mental; Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade; Programação Pactuada e Integrada de Assistência em Saúde (PPI) e Programação Geral de Ações e Serviços em Saúde (PGASS), sem prejuízo de outros assuntos serem incluídos na pauta a pedido dos membros da comissão sanitária.

Segundo o Promotor de Justiça Gabriel da Costa Rodrigues Alves, a mediação sanitária constituiu-se numa metodologia de efetiva aproximação do Ministério Público dos problemas complexos ligados à execução de políticas públicas da área de saúde, que tende a fortalecer os princípios e diretrizes do SUS mediante uma postura de fiscalização reflexiva, construtiva e coordenada com todos os atores da área.