A luta pela cura do câncer é diária e dolorosa, não só pelo fato de o paciente buscar o restabelecimento da saúde, mas também por ter que lutar pelo direito de receber um tratamento eficaz e de qualidade.

Foi na busca por esse direito, amparado pelo art. 196 da Constituição Federal de 1988, que a senhora Lacir Busanelli procurou a Ouvidoria do Ministério Público Estadual, no dia 28 de abril de 2017, para fazer uma denúncia sobre a situação do Hospital de Câncer de Campo Grande-MS Alfredo Abrão (HCAA), sobretudo em relação ao acelerador linear (máquina de radioterapia), que tinha mais de 30 anos de uso e estava apresentando problemas, deixando assim os pacientes em situação delicada devido à interrupção do tratamento por vários dias, quando a máquina parava de funcionar. Ela, que estava fazendo tratamento contra o câncer de estômago e já havia superado as fases de rádio e quimioterapia, se preocupava com os outros pacientes que estavam passando pela mesma situação que ela, de ter o tratamento interrompido por dias, podendo assim agravar ainda mais a doença.

No ano de 2016, dona Lacir procurou a imprensa local para fazer a denúncia. A emissora produziu uma matéria com a informação de que, na cidade de Goiânia (GO), havia um acelerador linear disponível, que seria doado para Campo Grande (MS), conforme prometido pelo Ministro da Saúde à época, e que o mesmo estaria em operação até o final de dezembro de 2016. Contudo, a Prefeitura da Capital e o Governo do Estado do MS não tomaram providências para agilizar a vinda do equipamento. Em contato com a Secretaria de Saúde Estadual, no dia 23 de março de 2017, dona Lacir foi informada de que o problema estava na desconformidade do “bunker” para recebimento da máquina e que seria necessária uma pequena reforma, mas que, pela inércia dos agentes envolvidos, ainda não havia acontecido.

A paciente então procurou a Ouvidoria do MPMS, que registrou a denúncia e a encaminhou para a 32ª Promotoria de Justiça da Saúde Pública, que tinha como responsável a Promotora de Justiça Daniela Cristina Guiotti, para adotar as medidas cabíveis. “Gostaria de agradecer ao Ministério Público Estadual, que me ouviu como ninguém tinha me ouvido. Cansei de ir aos outros órgãos e nunca ser recebida, e quando cheguei no Ministério Público, eu sentei e contei toda história, embora eu não precisasse do tratamento de radioterapia, porque eu já tinha passado por essa fase, mas eu acho que as pessoas que fazem o tratamento e vão pelo SUS aceitam o que eles falam, ‘a máquina quebrou’, ‘não tem prazo’, mas não é assim, nós temos nossos direitos”, desabafou.

Diante dos fatos, a Promotora de Justiça instaurou inquérito civil para apurar o número de pacientes que aguardavam a realização de tratamento radioterápico no município de Campo Grande apurar quais as medidas necessárias para a redução do tempo de sua espera. No curso da investigação, surgiu a informação da doação de um acelerador linear à Fundação Carmem Prudente de Mato Grosso do Sul (FCPMS) em 28 de abril de 2017 pela Associação de Combate ao Câncer em Goiás (ACCG).

Em reunião realizada com o então Diretor-Presidente do Hospital do Câncer, a Promotora de Justiça foi informada de que o termo de doação do acelerador linear fora assinado em 28 de abril de 2017 entre a FCPMS e a Associação de Combate ao Câncer em Goiás (ACCG). O Diretor informou ainda que levaria aproximadamente 150 dias para a conclusão das obras no “bunker” do hospital para a instalação do aparelho, bem como que tal obra e o transporte do aparelho seriam custeados pelo Estado de Mato Grosso do Sul.

Após várias tratativas, a Secretaria Municipal de Saúde informou que aguardava a instalação do novo acelerador linear para diminuir o tempo de espera para a realização de radioterapias na Capital e esclareceu que o prazo médio de espera para início do tratamento era de dois a três meses. No mês de junho do mesmo ano, 106 pacientes aguardavam o início do tratamento radioterápico em Campo Grande e, para amenizar a situação, os pacientes do HCAA foram transferidos provisoriamente para a Clínica Radius, para conclusão das obras do “bunker” do hospital, a fim de viabilizar a instalação do novo acelerador linear.

Já em dezembro de 2017, após a expedição de novo ofício, a Promotora de Justiça foi informada de que, no início de 2018, o novo acelerador linear do Hospital do Câncer começaria suas atividades e passaria a atender em três turnos, de forma a reduzir, ou mesmo zerar, a fila por tratamento radioterápico em Campo Grande.

De acordo com o Secretário de Estado de Saúde, Carlos Coimbra, um novo acelerador deve ser instalado no Hospital Universitário (HU) em meados de fevereiro de 2018 e, em 2019, um outro deve chegar para o Hospital Regional da Capital.

Dona Lacir, que continuou acompanhando o caso, disse que, se hoje há previsão para o acelerador linear começar a funcionar, foi graças ao Ministério Público Estadual. “A atenção que a Promotora de Justiça Daniela Guiotti teve com meu caso foi maravilhosa. Talvez a Promotora não tenha noção de quantas vidas ela salvou, mas eu digo que ela salvou muitas”, comemorou.

Texto: Ana Paula Leite/jornalista Assecom MPMS

Foto: Acelerador Linear (www.radiolaser.it)