O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por meio da 32ª Promotoria de Justiça da Saúde Pública desta Capital, com base nos elementos fáticos, técnicos e jurídicos colhidos nos autos do Inquérito Civil nº 20/2014, propôs Ação Civil Pública com pedido de Tutela Antecipada em desfavor do Município de Campo Grande, diante da falta de equipamentos essenciais na Unidade de Pronto Atendimento 24 Horas Aparecida Gonçalves Saraiva (UPA Universitário).

A Promotora de Justiça Filomena Aparecida Depolito Fluminhan levou em consideração, para propor a ação, as recorrentes reclamações de usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), que relataram dificuldades no acesso ao tratamento médico, insuficiência nas estruturas de atendimento de urgência e de diagnóstico gerando agravos à saúde do atendido e a falta de resolubilidade nos atendimentos. “Sabe-se que as Unidades de Pronto Atendimento/UPAs são estruturas de atendimento de complexidade intermediária entre a Atenção Básica e a Atenção Hospitalar, e estão constituídas dentro da Rede de Atenção à Urgência e Emergência de Mato Grosso do Sul”.

A representante do Ministério Público requereu a condenação do Município, nas seguintes obrigações de fazer:

a) Equipar a UPA Universitário com todos os equipamentos/aparelhos/materiais mínimos obrigatórios para o atendimento de urgência/emergência de sua competência, em quantitativo proporcional ao porte da unidade (Porte II), conforme rol estabelecido na Portaria nº 2.048/2002 do Ministério da Saúde, para as unidades não hospitalares de atendimento às urgências e emergências, quais sejam: estetoscópio adulto/infantil, esfigmomanômetro adulto/infantil, otoscópio com espéculos adulto/infantil, oftalmoscópio, espelho laríngeo, bolsa autoinflável ("ambu") adulto/infantil, desfibrilador com marca-passo externo, monitor cardíaco, oxímetro de pulso, eletrocardiógrafo, glicosímetro, aspirador de secreção, bomba de infusão com bateria e equipo universal, cilindro de oxigênio portátil e rede canalizada de gases ou torpedo de O² (de acordo com o porte da unidade), maca com rodas e grades, respirador mecânico adulto/infantil, foco cirúrgico portátil, foco cirúrgico com bateria, negatoscópios nos consultórios, serra de gesso e vários outros itens constantes da petição inicial.

b) Efetuar a aquisição e equipar os setores/salas da UPA Universitário com todos os equipamentos, materiais e mobiliários nos tipos e quantitativos apontados no Relatório de Visita Técnica do Conselho Municipal de Saúde, elaborado em 13/11/2015, que instrui a inicial.

c) Efetuar e registrar as manutenções preventivas e corretivas para assegurar o estado de integridade dos equipamentos/aparelhos disponibilizados na UPA Universitário, devendo ainda substituir os equipamentos/aparelhos que não estejam em condições de uso.

Segundo a Promotora de Justiça, como integrante da Rede de Urgência e Emergência, aquela UPA tem a competência de atuar como uma porta de entrada para a Atenção Hospitalar, efetuando os atendimentos iniciais, e de atuar de forma resolutiva nos casos que não necessitem internação hospitalar. No exercício dessas competências, constituem algumas das fundamentais funções da UPA em tela: estabilizar o paciente (por exemplo, no caso de insuficiência respiratória, parada cardíaca, crise convulsiva ou outras situações que necessitem de cuidado imediato); realizar triagem dos pacientes, segundo a classificação de risco, de modo a realizar o pronto atendimento dos casos de urgência e emergência; investigar o diagnóstico inicial da doença (viabilizando a transferência para unidade de maior porte, nos casos em que a resolubilidade do quadro depender de recursos superiores à capacidade/competência da UPA); e também atuar como entreposto de estabilização do paciente crítico para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU).

Diante disso foi instaurado o Inquérito Civil nº 20/2014, em 13/10/2014, com o objetivo de “apurar as irregularidades encontradas na vistoria realizada na UPA Universitário, consistente no defeito dos aparelhos Raio-X convencional e Raio-X periapical, bem como apurar a falta de médicos plantonistas”.

Com efeito, foi verificada a falta de medicamentos essenciais tanto para o atendimento básico como para aquelas situações de urgência/emergência que demandam a pronta atuação médica para a estabilização do paciente. Essa irregularidade já é objeto da Ação Civil Pública nº 0825030-69.2015.8.12.0001, movida pela 32ª Promotoria de Justiça em 16/7/2015. Aliado a isso, constatou-se que muitos pacientes com quadros agudos ou agudizados recebem atendimento meramente paliativo na UPA Universitário, diz a petição inicial.

De acordo com a Promotora de Justiça, sem resolubilidade de seus problemas, devido à insuficiência ou falta de materiais e equipamentos para o diagnóstico na primeira atenção qualificada e resolutiva para as pequenas e médias urgências, pacientes retornam com quadros agravados de doenças que não foram diagnosticadas e devidamente tratadas no primeiro atendimento, situação que gera risco de sequelas e até mesmo de evolução para óbito do atendido. Não bastasse a grave deficiência estrutural para a realização de diagnóstico com resolubilidade, evidenciou-se ainda a falta de diversos equipamentos que são essenciais para atendimento de pacientes recebidos em regime de urgência/emergência e que necessitam de monitoramento adequado para estabilização clínica.

Em todas essas situações, informa a petição inicial, ocorrem a falta e a insuficiência de equipamentos que obrigatoriamente devem existir em qualquer Unidade de Saúde 24 Horas da Rede de Urgência, porquanto são essenciais nas diversas etapas de atendimento nos serviços de UPA 24 Horas. São aparelhos/equipamentos/materiais tidos como essenciais desde a abordagem inicial do paciente para a triagem classificatória de risco (classificação de prioridade dos atendimentos de urgência/emergência); assim como na monitoração do paciente durante o atendimento/observação médica; e até mesmo para os diagnósticos básicos ou iniciais (fundamentais para a resolubilidade ou o adequado encaminhamento do usuário à atenção hospitalar).

A relatada situação foi confirmada pelos profissionais ouvidos pela Promotora de Justiça durante vistoria “in loco” realizada na UPA Universitário e nas demais unidades em 8/7/2015. Naquela oportunidade, foi realizada reunião com representantes da Secretaria Municipal de Saúde (Sesau), da Comissão de Saúde da Câmara Municipal de Campo Grande e do Conselho Regional de Medicina/MS, entre outros.

A Sesau informou medidas paliativas que seriam adotadas, que não demonstraram expressividade na solução do problema. Assim, “apesar de a Gestão Municipal anunciar pretensas adoções de medidas visando sanar as deficiências relacionadas à falta de equipamentos e materiais na UPA Universitário, não houve melhoria nesse sentido”, acrescenta a petição inicial.

A Promotora de Justiça requereu que, em caso de descumprimento da tutela provisória e/ou da sentença de mérito, seja o Município condenado a pagar multa diária de R$ 50 mil face à capacidade econômica do Município e considerando ainda a relevância do bem jurídico objeto da ação (a vida humana), cujo pagamento deverá ser em favor do fundo a que alude o art. 13 da Lei nº 7.347/85.

Foto: Simão Nogueira