Em atuação conjunta da 26ª Promotoria de Justiça de Campo Grande e do Núcleo Ambiental, várias empresas, representadas por suas associações, investirão na implementação da logística reversa das embalagens no Estado de Mato Grosso do Sul, o que aumentará o volume de materiais destinados à reciclagem, a remuneração de catadores e diminuirá a remessa de lixo para os lixões e aterros sanitários.

Em investigação, que tramita há dois anos, foi constatado que o Estado ficou de fora do acordo setorial nacional firmado entre o Ministério de Meio Ambiente e as associações de empresas e que prevê obrigatoriedade na implementação de sistema que determine o retorno das embalagens de produtos em geral aos seus fabricantes (conhecido como logística reversa e previsto no artigo 33 da Lei de Resíduos Sólidos).

Em razão disto, a 26ª Promotoria de Justiça, com apoio do Núcleo Ambiental, começou investigação sobre os prejuízos causados pela não implementação da obrigação, levantando em perícia que entre os anos de  2010 e 2017, a soma chega a R$ 86.696.316,26 (oitenta e seis milhões, seiscentos e noventa e seis mil reais, trezentos e dezesseis reais e vinte e seis centavos) em prejuízos ambientais (em razão da não reciclagem destes materiais), sociais (em razão da ausência de remuneração aos catadores de materiais recicláveis) e ao patrimônio público (em razão dos Municípios estarem arcando com uma responsabilidade que é do setor privado).

Além disto, segundo levantamento do Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica para Implantação da Logística Reversa por Cadeia Produtiva, realizado pelo IBAM (Instituto Brasileiro de Administração Municipal), a estimativa de investimentos para a implementação do sistema de logística reversa para o Estado de Mato Grosso do Sul é de R$ 39.688.786,72 e o custo operacional mensal do sistema de logística reversa para Mato Grosso do Sul é estimado em R$ 2.999.733,88.

Durante a investigação, foi proposto às associações e empresas – fossem elas signatárias ou não do acordo setorial nacional – que firmassem termos de cooperação ambiental para implementar parte do sistema.

Algumas associações já firmaram termos de compromisso ou apresentaram projetos de investimento, garantindo a compra de material reciclável (como vidro e aço), investimento em cooperativas (nove cooperativas até o momento), além de investirem em educação ambiental.

As associações e empresas que já se comprometeram com tais investimentos são:

ABIVIDRO – Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro;

ABRAFATI – Associação Brasileira dos Fabricantes de Tinta (abrangendo como “grande empresa”: Gerdau S/A)

ABEAÇO – Associação Brasileira de Embalagens de Aço (abrangendo como “grande empresa”: Gerdau S/A);

Outras associações ainda estão em fase de apresentação de propostas para possíveis termos de cooperação. São elas:

ABRAS – Associação Brasileira de Supermercados (Abrangendo como “grandes empresas”: ASSAÍ Atacadista, Carrefour e Wal Mart);

IBÁ – Indústria Brasileira de Árvores (abrangendo como “grande empresa”: Suzano Papel e Celulose);

ABAL – Associação Brasileira de Alumínio;

IBRAC – Instituto Brasileiro da Cachaça;

SESC - Administração Regional do Estado do Mato Grosso do Sul;

AURORA S/A;

Atacadão S/A;

Supermercados Comper (SDB Comércio de Alimentos LTDA ME)

A Promotora de Justiça Luz Marina Borges Maciel Pinheiro cita o caso do vidro em Campo Grande como exemplo de como a atuação do Ministério Público vem auxiliando a melhorar a situação. “Antes da atuação, o vidro não era destinado à reciclagem, causando prejuízo ao Poder Público que paga mais de R$ 100 por tonelada para depositá-lo em aterro e aos catadores que não recebiam pelo material. Após a atuação e articulação com a associação que representa os fabricantes do setor, todo o vidro separado em coleta seletiva na Cidade está sendo comprado e destinado à reciclagem.”

Parceria

As reuniões em que foram firmados os acordos, bem como as propostas que estão sendo negociadas têm apoio técnico do IMASUL e do Tribunal de Contas, no âmbito do programa “Resíduos Sólidos: Disposição Legal”, além de auxílio técnico da empresa “Demeter Engenharia” que foi contratada para a realização da perícia de valoração dos danos.      

Busca pela responsabilização – remessa das perícias para as Promotorias do Interior

Das 79 associações e empresas investigadas pelo Ministério Público em que já se constatou que deveriam estar implementando projetos na área, 62 não se manifestaram em firmar acordos.

Em razão da peculiaridade de cada Município, será avaliado o desmembramento do Inquérito Civil e remessa para cada uma das Promotorias de Justiça do Estado, com abrangência nos 79 Municípios, para que, com base nos prejuízos já levantados em perícia, possam adotar as providências cabíveis.

O Diretor do Núcleo Ambiental, Promotor de Justiça Luciano Furtado Loubet, estima que poderão ser propostas no Estado cerca de 395 ações civis públicas, já que em todos os Municípios o prejuízo está ocorrendo e a perícia levantada dividiu os cálculos por tipo de material (alumínio, papel/papelão, aço, plástico e vidro), sendo que a soma total poderá chegar a R$ 126.000.000,00.

As estratégias de atuação em todo o Estado serão discutidas em uma reunião virtual que acontecerá dia 11 de maio, onde todos os Promotores de Justiça ambientais irão debater o tema e buscar o melhor e mais efetivo encaminhamento.

Apuração criminal – possível falsidade dos relatórios apresentados ao MMA

Um dos argumentos utilizados pelas empresas é que, mesmo Mato Grosso do Sul não estando abrangido pelo acordo setorial, vem recebendo algum tipo de investimento por parte das empresas.

Contudo, em um levantamento preliminar determinado pela 26ª Promotoria e cumprido com apoio do Núcleo Ambiental, foi constatado que em relatório enviado ao Ministério do Meio Ambiente as empresas alegavam que, em Campo Grande, haviam instalados PEVs (Pontos de Entrega Voluntária de material reciclável) em quatro locais (Cervejaria Petrópolis, Grupo Pão de Açúcar, Carrefour e Extra), mas, não foram encontrados estes pontos no Pão de Açúcar e no Extra, sendo que, na Cervejaria Petrópolis o ponto encontra-se em local fechado e de uso exclusivo da empresa, não podendo, portanto, ser considerado como investimento em logística reversa.  

Esta situação levará à instauração de um Inquérito Policial para apurar eventual crime de declaração falsa previsto no artigo 69-A da Lei de Crimes Ambientais, o que pode acarretar em pena aos responsáveis de 03 a 06 anos de reclusão e multa.

Outras consequências: mercado de valores e certificação

Na intimação às associações representantes das empresas, para apresentarem suas propostas para possível acordo, dentre os fundamentos, é citado que o não cumprimento da legislação ambiental pode ter não só consequências judiciais, mas, inclusive, frente ao mercado de valores, conforme avaliação a ser feita pela Comissão de Valores Mobiliários.

Além disto, foi esclarecido à reportagem pelos Promotores de Justiça que o descumprimento da legislação ambiental também pode levar, conforme o caso e regras de cada certificadora, ao perdimento de certificados ambientais, tais como o ISSO 14001, uma vez que é requisito mínimo para a certificação que as empresas cumpram padrões mínimos de governança responsável.

Texto e foto: Núcleo Ambiental