Em ação penal oriunda da comarca de Dois Irmãos do Buriti (MS), o Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por intermédio da Promotora de Justiça Simone Almada Góes, denunciou A. V. L. pela prática do crime descrito no art. 213 c/c art. 224, “a”, ambos do CP, uma vez que constrangeu a vítima menor de 14 anos à conjunção carnal mediante violência presumida, fato ocorrido em período anterior à vigência da Lei nº 12.015/2009.  

Ao término da instrução, o juiz julgou improcedente a pretensão punitiva, absolvendo-o, com fulcro no art. 386, III, do CPP, sob o fundamento de que a vítima concordou com a realização do ato sexual, tornando, portanto, o ato praticado atípico.

Irresignado, o Parquet interpôs apelação criminal requerendo a condenação do acusado nos termos da denúncia.

A 1ª Câmara Criminal do TJMS, por maioria, proveu o recurso ministerial para julgar procedente o pedido contido na denúncia e condenar o réu à pena de 6 anos de reclusão, em regime semiaberto, pela prática do crime previsto no art. 213 c/c art. 224, “a”, ambos do CP.

Descontente, a defesa opôs embargos infringentes com o fito de fazer prevalecer o voto minoritário proferido pelo Vogal, que divergiu do Relator para manter a sentença absolutória em todos os seus termos.

No julgamento, a 1ª Seção Criminal do TJMS, por maioria, deu provimento aos embargos infringentes para absolver o réu com base no art. 386, III, do CPP, sob a justificativa de que ausente o elemento subjetivo do tipo penal insculpido no art. 213 c/c art. 224, “a”, do CP.

Assim é que a 12ª Procuradoria de Justiça Criminal, por meio da Procuradora de Justiça Lucienne Reis D’Avila, interpôs Recurso Especial, almejando o restabelecimento do acórdão que condenou o recorrido às penas dos arts. 213 e 224, “a”, do CP.  Aduziu, para tanto, que a presunção de violência nos delitos sexuais perpetrados contra menor de 14 anos possui caráter absoluto, sendo irrelevante a prévia existência de relacionamento amoroso, vivência da vítima ou quaisquer perquirições desta ordem.

Após parecer favorável do MPF, o Superior Tribunal de Justiça, em decisão monocrática proferida pelo Min. Ribeiro Dantas, proveu o REsp nº 1.687.658/MS para condenar o recorrido como incurso no art. 217-A do CP, restabelecendo-se a pena aplicada no acórdão que julgou procedente a apelação interposta pelo Ministério Público, qual seja, 6 anos de reclusão, em regime semiaberto.

O Ministro realçou que a Corte da Cidadania, por meio do julgamento do Recurso Especial representativo da controvérsia nº 1.480.881/PI, consolidou a orientação de que “para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime”.

Após, a defesa opôs embargos de declaração com o desiderato de sanar contradição na decisão, visto que o embargante não foi denunciado pelo crime do art. 217-A do CP, como afirmou o Ministro, mas sim pelos arts. 213 e 224, “a”, ambos do CP. Ao final, pugnou pela anulação da decisão e absolvição do acusado.

Os aclaratórios foram parcialmente acolhidos, apenas para corrigir erro material no dispositivo da decisão monocrática, a fim de constar a condenação pela prática do delito insculpido no art. 213 c/c art. 214, “c”, do CP.

Adiante, a defesa interpôs Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 1.687.658/MS, ponderando que foi denunciado pelo art. 213 c/c art. 224 do CP e não pelo art. 217-A do CP, bem como que a presunção de violência resta refutada em virtude das circunstâncias do caso concreto, ensejando, portanto, a absolvição do recorrente.

Todavia, a Quinta Turma do STJ negou provimento ao recurso defensivo, assentando que a conduta não comporta relativização da violência, sendo absoluta, de modo que a aquiescência da ofendida ou mesmo sua experiência sexual não tem relevância jurídico-penal.

O trânsito em julgado dessa decisão ocorreu em 21.6.18 e o inteiro teor da decisão monocrática e do acórdão pode ser consultado, respectivamente, nos seguintes endereços:

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=MON&sequencial=80739122&num_registro=201701907489&data=20180228&formato=PDF

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1706575&num_registro=201701907489&data=20180511&formato=PDF

Texto: 12ª Procuradoria de Justiça