No Recurso Especial nº 1.710.230/MS, interposto pelo Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul, perante o Superior Tribunal de Justiça, a Ministra Relatora Maria Thereza de Assis Moura reformou acórdão da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, proferido na Apelação Criminal nº 0001697-79.2015.8.12.0015, para aplicar a teoria da amotio, afastando a tentativa, e para aplicar a causa de aumento de pena do repouso noturno ao furto qualificado.

O Ministério Público Estadual interpôs recurso de Apelação contra a sentença que julgou parcialmente procedente a denúncia, para condenar Almir Claro Miranda à pena de 1 (um) ano, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 8 (oito) dias-multa, em regime semiaberto, por infração ao artigo 155, § 4º, inciso I, combinado com artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal.

Em suas razões recursais, requereu o aumento da pena-base; o afastamento da minorante da tentativa; a aplicação da majorante do repouso noturno; e a alteração do regime prisional para o fechado.

Almir Claro Miranda apresentou contrarrazões ao recurso ministerial e também interpôs recurso de Apelação, pugnando por sua absolvição, ante a aplicação do princípio da insignificância.

O órgão ministerial apresentou contrarrazões pelo desprovimento do recurso defensivo.

A 1ª Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, por maioria, negou provimento ao recurso defensivo e deu parcial provimento ao recurso ministerial, apenas para elevar a pena-base.

Inconformado, o Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul, por sua 3ª Procuradoria de Justiça Criminal, de titularidade do Procurador de Justiça Gilberto Robalinho da Silva, interpôs Recurso Especial, com fulcro no artigo 105, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, em razão da contrariedade do artigo 155, §§1º e 4º, combinado com artigo 14, inciso I, ambos do Código Penal.

Em decisão monocrática, a Ministra Maria Thereza de Assis Moura deu provimento ao Recurso Especial para afastar a tentativa e para aplicar a causa de aumento de pena descrita no artigo 155, §1º, do Código Penal, ao furto qualificado, consignando que a “...jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, bem como do Supremo Tribunal Federal, há muito se pacificou o entendimento no sentido da adoção da teoria da aprehensio ou amotio, que considera consumado o delito no momento em que o agente se torna possuidor da res furtiva, ainda que a posse não seja de forma mansa e pacífica, não sendo necessário que o objeto subtraído saia da esfera de vigilância da vítima. Esse entendimento, inclusive, restou confirmado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.499.050/RJ

(...)

No presente caso, o Tribunal de Justiça decidiu que "o apelante retirou os bens do interior da casa da vítima após pular o muro e arrombar a porta, tendo deixado os objetos Documento: 86368398 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 16/08/2018 Página 2 de 5 Superior Tribunal de Justiça ainda sobre o muro, quando foi surpreendido por um vizinho" (fl. 346). E, restando incontroverso nos autos que, embora não tenha sido mansa e pacífica, houve a inversão da posse da res furtivae, com base na teoria da aprehensio ou amotio deve ser provido o recurso ministerial para reconhecer a consumação do delito de furto na espécie, na linha da jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça.

(...)

Quanto à possibilidade de aplicação, na hipótese de furto qualificado praticado durante o período de repouso noturno, da majorante prevista no artigo 155, § 1º, do Código Penal, a legislação estabelece que:

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

A matéria foi apreciada pela Sexta Turma no julgamento do HC n.º 306.450/SP, de minha relatoria, tendo sido acolhido o entendimento segundo o qual a causa de aumento prevista no § 1° do artigo 155 do Código Penal, que se refere à prática do crime durante o repouso noturno - em que há maior possibilidade de êxito na empreitada criminosa em razão da menor vigilância do bem, mais vulnerável à subtração -, é aplicável tanto na forma simples como na qualificada do delito de furto.

Consoante consignei naquele julgamento, referida causa de aumento pode incidir tanto no crime de furto simples (caput) como na sua forma qualificada (§ 4°). Isso porque tal entendimento está em consonância, mutatis mutandis, com a posição firmada por este Sodalício no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.193.194/MG, de minha Relatoria, no qual se afigurou possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º do artigo 155 do Código Penal nos casos de furto qualificado (CP, art. 155, § 4.º), máxime se presentes os requisitos.

Dessarte, nessa linha de raciocínio, não haveria justificativa plausível para se aplicar o § 2° do artigo 155 do Código Penal e deixar de impor o § 1° do referido artigo, que, a propósito, compatibiliza-se com as qualificadoras previstas no § 4° do dispositivo.

Deve ser reconhecida, portanto, a incidência da causa de aumento de pena prevista no artigo 155, § 1º, do Código Penal”.

No link abaixo, é possível obter acesso à decisão do Superior Tribunal de Justiça:

 

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=MON&sequencial=86368398&num_registro=201702977044&data=20180816&formato=PDF