Em virtude de irregularidades constatadas na venda de um lote de terreno urbano realizada pela Associação Evangélica de Proteção aos Desamparados de Bela Vista (“Abrigo Bela Vista” ou “Lar do Idoso”), o Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por meio do Promotor de Justiça William Marra Silva Júnior, ingressou com Ação Declaratória de Nulidade de Negócio Jurídico cumulada com Tutela Provisória de Urgência.

O ajuizamento da ação se deu por ter sido constatado que a alienação não está em conformidade com as regras do estatuto da entidade, bem como porque o imóvel foi vendido por um valor muito inferior ao praticado no mercado, caracterizando aparente prejuízo ao patrimônio da associação e, consequentemente, aos usuários que dela dependem, especialmente aos idosos vulneráveis. A venda do lote também não corresponde aos objetivos e finalidades da associação, uma vez que pretende dispor de considerável parte de seu patrimônio por valor proporcionalmente inexpressivo, além de a alienação ter sido deliberada de maneira genérica, sem qualquer aprofundamento e controle interno ou comunicação prévia ao órgão do Ministério Público.

O Ministério Público destaca ainda a situação estrutural precária em que se encontra o “Lar do Idoso”, conforme foi constatado durante vistoria conjunta realizada no mês de junho pelas equipes da 1ª Promotoria de Justiça de Bela Vista, do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) e da Vigilância Sanitária do Município de Bela Vista, cuja adequação será objeto de ação específica.

Segundo as investigações, o lote negociado perfaz a área total de 7.500 m² e foi vendido pelo valor total de R$ 200.000,00, o equivalente a apenas R$ 26,66 o metro quadrado, isto é, preço muito abaixo do valor praticado no mercado, tendo em vista que, mediante pesquisa de preços realizada pela equipe do MPMS, foi possível verificar que o valor do metro quadrado na região do Abrigo de Bela Vista gira em torno de R$ 208,33. Ou seja, o valor real do lote, de acordo com o padrão de valorização atual de mercado, equivale ao valor aproximado de R$ 1.562.500,00, patamar muito acima do preço negociado.

Ainda, consta na ação que a venda do lote não observou as regras do estatuto da associação, assim como foi precariamente debatida, sem aprofundamento ou análise de seu Conselho Fiscal, cuja Assembleia Geral Extraordinária sequer fora regular e previamente convocada nos moldes estatutários. Tampouco houve comunicação ao Ministério Público. A Escritura Pública de Compra e Venda também deixou de atender às exigências legais, uma vez que o Tabelião deixou de exigir e mencionar no ato de sua lavratura a documentação indispensável que comprova a representação legal da pessoa jurídica para a realização do negócio, consoante estabelece o Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul (Provimento nº 1, de 27 de janeiro de 2003).

Devido às irregularidades, o MPMS requereu a concessão da Tutela Provisória de Urgência (pedido liminar), a fim de declarar a nulidade da Assembleia Geral Extraordinária realizada em 29/1/2020 pelo Abrigo Bela Vista e da Escritura Pública de Compra e Venda registrada no cartório de registros de imóveis local, desconstituindo-se, assim, o negócio jurídico de alienação do lote de terreno. Pleiteou, ainda, que seja determinado à presidente da associação que realize o depósito do valor já recebido pela venda em conta judicial, consistente em R$ 140 mil, para fins de sua imediata restituição ao patrimônio da Associação Evangélica de Proteção aos Desamparados de Bela Vista, mediante expedição de alvará judicial, se necessário, sob pena de multa pessoal no valor de R$ 5 mil, por dia de atraso.

Em caso de dilapidação ou extravio do valor acima, o MPMS pleiteou a desconsideração da personalidade jurídica da associação, para compelir a presidente a efetuar o depósito do valor acima, a fim de garantir a restituição ao patrimônio da entidade, sem prejuízo de fixação dos meios coercitivos disponíveis para a garantia da efetivação da obrigação.

Texto: Ana Paula Leite/jornalista Assecom MPMS