Dimana dos autos que o réu V. A. M. havia sido excluído das fileiras da Polícia Militar do Mato Grosso do Sul por decisão administrativa do Comandante-Geral da Corporação, em virtude de condenação por crimes de homicídio e ocultação de cadáver, as quais, no entendimento da autoridade prolatora, traduzem condutas incompatíveis com o escorreito exercício das atribuições do cargo de policial militar. A decisão administrativa, em síntese apertada, concluiu o seguinte:

“Assim, não há como se admitir a possibilidade de que um policial militar, o qual, perante a Bandeira Nacional, jurou ‘regular suas condutas pelo preceito da moral’, permaneça na instituição, após agir contrariamente ao estatuído para os defensores da sociedade. [...] Mas aqui não se está a avaliar se o Acusado é ou não competente funcionalmente. Cuida-se, sim, de examinar suas condições morais, seus valores éticos, sua probidade, requisitos indispensáveis para o exercício da função ou do serviço público.”

Ocorre que, em apelação criminal interposta pelo infrator, o TJMS, através da 2ª Câmara Criminal, anulou a aludida decisão administrativa, por entender, na essência, que: “O histórico do policial militar na carreira, a ausência de demérito na função, além de restar demonstrado que o delito foi fato isolado em sua vida deve ser considerado para inviabilizar sua exclusão administrativa das fileiras, mormente se o Conselho de Disciplina foi favorável à sua manutenção na função.” (sic)

Diante disso, a 12ª Procuradoria de Justiça, por meio da Procuradora de Justiça Lucienne Reis D’Avila, instou o TJMS, mediante embargos de declaração, a debater sob qual dos 3 ângulos juridicamente admissíveis (razoabilidade, proporcionalidade ou legalidade) o ato administrativo foi anulado.

Tais aclaratórios foram rejeitados, o que ensejou a interposição de recurso especial, no bojo do qual o Parquet Estadual invocou:

I) contrariedade ao art. 619 do CPP e ao art. 535, II, do CPC/1973 (omissão de questão relevante para a causa);

II) contrariedade ao art. 2º, caput, da Lei 9.784/1999, pois: a) o controle judicial dos atos administrativos deve ocorrer sob as perspectivas formal e de juridicidade (legalidade,  proporcionalidade e razoabilidade), não sendo admissível a incursão do Judiciário em seu mérito além desses lindes; e b) o TJMS anulou o  ato administrativo (exclusão de policial militar por ofensa aos valores éticos e morais da Corporação) com base em fundamentos atrelados à conveniência, e não à legalidade, proporcionalidade e razoabilidade (adentrando demasiadamente, portanto, o mérito administrativo).

A negativa de seguimento do especial desaguou na interposição de Agravo, que foi conhecido e improvido, de modo que a 12ª Procuradoria de Justiça, novamente, agravou da decisão, requerendo a reconsideração do decisum ou a submissão do feito ao órgão colegiado.

Após análise dos autos, os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (Herman Benjamin, Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães), por unanimidade, deram provimento ao Agravo Interno, para dar provimento ao Recurso Especial do MPMS, nos termos do voto do Ministro Relator Francisco Falcão.

Para o Ministro Relator, “o recorrente apresentou questão jurídica relevante, qual seja, os fundamentos para o controle judicial do ato administrativo que deu azo à reforma da decisão do Comandante-Geral da Polícia Militar Estadual. Apesar de provocado, por meio de embargos de declaração, o Tribunal a quo não apreciou a questão. Nesse contexto, diante da referida omissão, apresenta-se violado o art. 535, II, do CPC/73, o que impõe a anulação do acórdão que julgou os embargos declaratórios, com devolução do feito ao órgão prolator da decisão para a realização de nova análise dos embargos.”

Tal decisão transitou em julgado no dia 17/3/2021 e seu inteiro teor pode ser consultado no seguinte endereço:

https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1801466&num_registro=201502748533&data=20190318&peticao_numero=201600398804&formato=PDF

Texto: 12ª Procuradria de Justiça Criminal

Foto: STJ