Ao completar 34 anos de existência, a Constituição Federal de 1988, comemora, nesta data, numerosas conquistas na seara dos direitos humanos e sociais indisponíveis, tanto na esfera pública, como na vida privada.

Um dos mais festejados avanços se vê cristalinamente na tutela dos denominados interesses difusos, coletivos, e individuais homogêneos.

Tais direitos refletem a oportuna e inspirada acolhida legislativa da Lei 7.347/85, elaborada por eminentes juristas membros do Ministério Público Paulista, que antevendo a aplicação do então novo direito que sugeria e até recomendava a abertura do ordenamento jurídico, inferiu legitimidade ativa ao Ministério Público para atuar na referida nova atuação funcional, abrigando a nova tutela por meio dos instrumentos de criação do Inquérito Civil e da Ação Civil Pública.

Relevante notar que tanto os referidos direitos, como também os instrumentos de tutela elaborados, tiveram grande evolução funcional e institucional no seio do Parquet de sorte que a cautela e a prudência delinearam as primeiras providências em tais questões absolutamente novas para época. Foram conferidos os atuais poderes de atuação ministerial, cujo êxito e sucesso avançou e se espraiou para proteção de outros bens públicos indisponíveis, tais como os referidos no âmbito da improbidade administrativa.

Por experiência própria, faz-se oportuno mencionar que os meios de apuração, desde então, nos casos de ofensas a tais amplos direitos a serem albergados pela ordem jurídica vigente, foram norteados pela natureza jurídica do novel direito, quer porque os sujeitos protegidos são indeterminados e indefinidos, quer porque os meios de provas e as consequências do processo executivo, que se prestavam especialmente às formas de solução do direito privado, faziam-se também de analítica compreensão quanto aos efeitos produzidos.

Some-se a tais assertivas que também o tema soava como novidade ao Poder Judiciário, que também vislumbrava dificuldades de ordem prática em matéria de provas e execução.

Sendo assim, no início, as providências apuratórias se faziam tímidas e escassas, em face da extensão e da natureza dos direitos invocados.

Chegou-se a tal ponto que cinco ou dez anos após o reconhecimento constitucional e legal de tais medidas investigativas, havia pouca visibilidade da atuação ministerial, podendo vislumbrar-se o eco das vozes legiferantes do País no sentido de que tais direitos poderiam ser retirados da esfera de atuação do Ministério Público.

No entanto, progressivamente, as atividades ministeriais se intensificaram de tal modo que se tornou praxe nas criadas Promotorias de Justiça Especializadas, em todas as esferas dos direitos difusos, coletivos, e demais individuais indisponíveis, em todas as áreas, desde a ambiental, que guardava proeminência já àquela época, tendo o Brasil sediado o Encontro do Rio/2002, perpassando pelas áreas do consumidor, do patrimônio histórico/cultural até a tutela do patrimônio público que hoje ganhou significativa relevância institucional.

Como efeito de tal reiterada e exitosa atuação, criaram-se instrumentos menores de eficácia resolutiva dos conflitos de interesses no âmbito do IC, PP, NF, PIC, e inclusive do TAC que ganhou força de título executivo extrajudicial.

Em síntese, é de se ponderar que as novas e atuais atividades do Ministério Público nessa área viabilizaram os acordos e os ajustamentos de conduta contraprestacional de medidas reparatórias ou indenizatórias em relação aos atos infracionais praticados e cometidos como metas resolutivas dos conflitos de interesse.

Restou ao Ministério Público, por conseguinte, a mediação/intermediação dos referidos conflitos de interesses, na seara administrativa, que, inobstante não produzam coisa julgada, apresentam a eficácia de relevante interesse público de arbitramento no que tange a soluções dos interesses em apreço.

O efeito disso é que se descumpridos os acordos por infringência das metas arbitradas, ou se dá o prosseguimento das investigações no âmbito do Inquérito civil ou se propõe a Ação Civil Pública competente.

Outra questão que merece destaque, diz respeito ao fato de que, por similitude ao Inquérito Policial, se houvesse Inquérito Civil, deveria ser proposta a Ação Civil Pública competente assim como se oferece, em regra, a Ação Penal Pública, nos casos de Inquérito Policial.

Houve quem sustentasse no CSMP, nos primórdios da vigência dos novos procedimentos, que as consequências do arquivamento do Inquérito Civil implicariam em fracasso na tutela dos novos direitos, porquanto não se dava sequência judicial ao procedimento administrativo.

Ao revés, na época atual de consagração ao MINISTÉRIO PÚBLICO RESOLUTIVO tem-se que a imensa maioria das infrações restou solucionada no âmbito administrativo, sem que haja necessidade de transformação das investigações em processos judicializados.

Portanto, a desvinculação do centenário Inquérito Policial do Inquérito Civil, por se tratarem de soluções diversas das aplicáveis na esfera criminal, tornam as atividades ministeriais profundamente eficientes e eficazes nas soluções dos direitos da referida ordem de tutela.

Somente a título de ilustração e amostragem, em sede administrativa de soluções de conflitos pelo Parquet, colhem-se os seguintes dados do site do Ministério Público:

-Julgamentos do CSMP em 2020:

Arquivados – Inquéritos Civis (1044); Procedimentos Preparatórios (111); Recursos em Notícias de Fato  (26); Recursos em Procedimentos Administrativos (4).

                -Julgamentos do CSMP em 2021:

Arquivados – Inquéritos Civis (907); Procedimentos Preparatórios (115); Recursos em Notícias de Fato (22); Recursos em Procedimentos Administrativos (1).

Acredita-se que nem mesmo os ilustres juristas que elaboraram a Lei de Ação Civil Pública, tenham imaginado a extensão dos efeitos garantistas dos relevantes direitos tutelados pela Constituição Federal de 88, que permanecem sempre atuais às necessidades do momento presente.

O Ministério Público Resolutivo, inaugura, portanto, uma nova ordem constitucional e jurídica de tutela dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil, conferindo as funções institucionais ao mais elevado desiderato de órgão de pacificação social, sobretudo na esfera administrativa, como regra, sem prejuízo da atuação residual no âmbito Judicial!

 

 

Evaldo Borges Rodrigues da Costa - Procurador de Justiça e Conselheiro do CSMP.